Minha Swaroviski

By Marlise Vidon - 1/27/2023 10:01:00 AM

 


   Minha caneta Bic acabou. Abri a gaveta em busca de uma nova. Foi quando me deparei com a linda caneta Swaroviski que ganhei há anos e não usei. Na ocasião, tentei trocar na loja por julgar a caneta muito chique para mim. Como não fazem troca de canetas, optei por guardá-la para uma ocasião especial.

   Quantas vezes peguei aquele vestido bacana e guardei. Parece que a gente sente necessidade de se boicotar, guardar o melhor para o futuro sem nem mesmo saber se ele acontecerá. Certa vez, vi roupas de alguém falecido serem distribuídas em alguns minutos, sem nenhuma cerimônia. Passamos a vida pagando boletos de carro e de casa, para depois nossos herdeiros brigarem por nossos bens. A casa rapidamente é colocada à venda e joias vão para gaveta de algum filho. Tudo evapora, com a vida que se vai.

   Vejo milionários juntando mais e mais riquezas, enquanto se distanciam do que importa, sua família e seus amigos. E quanto mais ricos, maior a angústia de não saber se quem está ao lado o faz por afeto ou interesse. Seus filhos são mimados ao extremo para no futuro, não saberem lidar com frustrações, se tornarem infelizes e indiferentes à dor do outro. E políticos cegos com o poder, ignorando seu dever de servir ao povo, com um bando de puxa-sacos ao redor.

   Nos EUA, ouvimos sempre o ridículo termo "looser" para quem não conseguiu sucesso financeiro e a família perfeita. Como se existisse perfeição em alguma existência.

   Penso no velho ditado: "caixão não tem gaveta". Nem para dinheiro, muito menos para o poder.

   Por outro lado, há que se pensar na reserva. Não vou usar meus vestidos bacanas no trabalho. Vou usá-los com quem gosto, no dia que julgar melhor. E vou beber na taça de cristal mais linda, com cuidado. Irei me certificar de ter plantado relações de amor, para no caso do vestido rasgar e a taça quebrar, ter alguém para partilhar minha decepção.

   Talvez não se deva viver desvairadamente, como se não houvesse amanhã, pois a urgência só atropela os sentimentos verdadeiros. Mas também não se deva viver pensando no futuro, economizando, amontoando bens. Mais uma vez me deparo com a balança. Somos mesmo equilibristas nesse mundo maluco. Deve-se pensar no que é de fato importante, enquanto caminhamos pelo tempo.

   Chamo de herança eterna o conhecimento, o afeto compartilhado, o pão dividido. Esses são os tesouros. Os outros são brinquedos da vida. Mimos.

   Peguei minha Swaroviski e fui trabalhar. 

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