Meu plano funerário

By Marlise Vidon - 8/22/2023 11:10:00 AM



A gente vai pegando uma “certa idade” e não passa um mês sem que alguém próximo morra. Só esse ano foram três velórios de pessoas queridas. A morte passa a fazer parte da rotina. Vai penetrando na mente, se tornando temida e presente. Por mais que a espiritualidade ajude, a morte continua sendo nosso grande enigma. 

Encontrei um amigo no elevador e dividi com ele minha angústia. Ele disse que já foi em mais velórios do que eu esse ano. Que o problema era a pouca cerveja que tais pessoas consumiam. Rimos e nos despedimos. Mas fiquei assim, encafifada com o assunto. 

Diante das fortes evidências de que a minha chegará um dia, resolvi pensar em um plano funerário. Pesquisando com minhas amigas, descobri que uma delas já até tinha um plano, a danada nem me avisou. A outra falou: “quero nem saber, vou deixar seguro, minha filha que se vire”. O marido dela disse que vale mais morto do que vivo. Ambos preferem não falar sobre o assunto. Um outro conhecido contou que paga na maior alegria sua cova.  

E ser enterrada ao lado de quem se ama, ainda procede? Outra amiga comprou com o marido uma cova para toda família. Hoje estão separados, com antipatia um do outro e ao morrer, ficarão juntinhos por toda eternidade. Perguntei o que ela achava, respondeu: “fazer o quê”. 

Há aqueles que querem ser cremados. Descobri que minha filha é uma delas e espero que resolva seu destino com nossos descendentes quando eu já estiver bem morta. Cruzes, prefiro ficar lá, quieta no caixão a pegar fogo. Soube também que não estão deixando jogar as cinzas em qualquer local. Gostaria de saber o que farão se me pegarem jogando as cinzas de algum familiar onde não seja permitido – me mandarão recolher?  

E o preço dos cemitérios e dos caixões? Um horror! Nem para morto o povo dá desconto. Tem caixão para todo gosto, como se não fosse virar tudo pó no final. Uma conhecida pediu um caixão mais barato para seu pai baseada nesse princípio, mas infelizmente ele não coube no dito cujo. Ela teve que fazer um upgrade de caixão, à contragosto.  

Minha mãe me disse para ficar tranquila, que a família pode morrer em paz que cabe na cova de minha cidade natal, desde que a gente não morra tudo de uma só vez. Caí na gargalhada e agradeci. Muito animador passar o resto da minha morte espremida numa cova com toda minha família. Sem falar que moro a quase 400 Km de lá.  Por via das dúvidas, plantei ao redor da cova. Uma sombrinha cai bem.  

Enfim, não tá mole planejar a morte. Poucos se preparam para o fim. Eu ando pensando em todas as possibilidades, perguntando por aí qual a melhor saída. Sinceramente não cheguei à conclusão alguma. Se imaginar morto é ruim em todos os ângulos: cremado, enterrado, com quem ama ou solitário. De forma que achei melhor deixar meu plano funerário para outra hora.  

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